segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

A Democratização da Inovação Tecnológica e o Conceito de Pivô


A Democratização da Inovação Tecnológica e o Conceito de Pivô

E-mail Imprimir PDF
Muito além de um ecossistema de ferramentas de comunicação e de troca de informações, a internet tem se mostrado um extraordinário instrumento de democratização da capacidade de produzir inovação tecnológica. Desde a sua concepção no final dos anos 1960’s que a internet foi projetada para servir tanto como um meio de estabelecer uma rede no sentido abstrato do termo, como um instrumento para abrigar redes heterogêneas ao mesmo tempo em que permitisse que essas redes funcionassem independentemente, isto é, tanto como um conjunto de componentes quanto como a própria entidade que agrega esses componentes.
A capacidade generativa de audiências que não se conhecem e, não necessariamente gozam de mútua credibilidade, de construir e distribuir código executável através da internet para milhões de computadores pessoais transformou-se no estopim de um crescimento e um turbilhão de inovações em tecnologia da informação, ao mesmo tempo que propiciou terreno fértil para a criatividade e o empreendedorismo. A bem da verdade, tantas são as inovações já acalentadas pela internet que não seria exagero admitir que os impactos da rede na história da humanidade se situam no mesmo diapasão que os do carro Modelo T da Ford e os da prensa de Gutemberg.

Abertura tem sido, desde o início, uma das características fundamentais da internet: qualquer computador ou dispositivo de processamento de informações poderia fazer parte da rede, desde que houvesse uma interface apropriada, o que, via de regra, não era difícil de montar. Reproduzindo e, ao mesmo tempo, ampliando o crescimento explosivo da internet, a popularização de um dispositivo multifuncional e facilmente reconfigurável como o computador pessoal permitiu que o universo de usuários que escrevem software para esse dispositivo viesse a atingir larga escala e um alto grau de diversidade. Não obstante a mais recente tendência de criação de sistemas fechados sobre a rede aberta (veja-se o exemplo dos sítios de aplicativos dedicados a plataformas específicas), a diversidade e a escala têm levado a uma ampla variedade de aplicações responsáveis por inovações em áreas as mais diversas tais como política, entretenimento, jornalismo, educação, publicidade, economia.
O fato é que os baixos custos da inovação na forma de aplicação (software) sob uma arquitetura aberta permitem o surgimento de inovações sob os mais diversos modelos de financiamento. Dado que, regra geral, uma nova aplicação nem sempre demanda grandes investimentos em capital, o inovador pode buscar implementar sua idéia apenas durante seu tempo livre, sem ter que abandonar seu emprego ou ocupação atual. Trata-se de aspecto de grande valia, sobretudo se ainda há dúvida sobre sua viabilidade técnica ou mesmo sobre a existência de uma demanda. Além do mais, a queda de preços nos produtos de tecnologia, a disponibilidade de software de código aberto, a comoditização da tecnologia, o fácil acesso a serviços terceirizados de tecnologia (crowd-sourcing), e a computação em nuvem, todos esses fatores têm reduzido os custos necessários para a construção de novos produtos. Em palestra recente ao Stanford Technology Ventures Program (“FundingThunderLizardEntrepreneurs”, 27/10/10), a investidora Ann Miura-Ko, parceira da empresa de investimentos de risco Floodgate, destaca que esses elementos têm contribuído para criar uma grande flexibilidade de prototipagem rápida, e uma nunca dantes vista facilidade e capacidade de ajustar novos produtos para o mercado.
É justamente nesse sentido que Eric Ries, autor do blog “StartupLessonsLearned.com” e conhecido defensor do método “The Lean Startup” de desenvolvimento de produtos no contexto de tecnologia para inovação, defende que o paradigma “inovação através da experimentação” se aplica perfeitamente ao universo de startups (empresas recentemente criadas), principalmente, mas não apenas, as de serviços de internet. Segundo Ries, a maioria das startups fracassa, uma grande parte por razões que poderiam ser evitadas, e portanto não deveríamos nos acomodar e aceitar passivamente o baixo nível de sucesso que se observa na indústria do capital de risco. É preciso renunciar a alguns preciosos mitos do empreendedorismo como se pratica nos dias de hoje, e mudar a forma de operar no mercado de investimento em inovação tecnológica. Ries começa definindo: “uma startup é uma instituição humana desenhada para entregar um novo produto ou serviço sob condições de extrema incerteza”. O que diferencia uma startup bem sucedida é a capacidade de trazer à tona as melhores idéias sob extrema dificuldade, ou seja, a capacidade de encontrar o “pivô” – o ponto de reinvenção no qual a startup se dá conta de que suas idéias originais carecem de uma reinstrumentalização. E, mais importante, a startup bem sucedida é aquela que consegue encontrar seu mercado antes que o dinheiro acabe.
Conforme defende Miura-Ko, uma startup bem sucedida não floresce unicamente de uma grande idéia: o sucesso decorre da capacidade de fazer crescer um negócio em torno da grande idéia. O ecossistema do capital de risco, uma razoável base de clientes, canais de distribuição e fabricação acessíveis, todos esses fatores acabam convergindo para um modelo de negócios que se revela viável e escalável. Justamente, a internet serve de laboratório de experimentação no qual os empreendimentos podem testar com agilidade seus modelos de negócio, usando, por exemplo, mídia social alavancada por uma criação de demanda e estruturas de preço flexíveis.
Com base na premissa de que uma idéia inovadora não necessariamente tem um mercado que esteja pronto para absorvê-la, a proposta de Ries é que o desenvolvimento de um produto seja feito incremental e interativamente em parceria com o suposto universo de clientes, para que se minimize o tempo entre os pivôs. Ainda que correndo o risco de mal comparar, o lançamento de alguns produtos da Google, por exemplo, se dão por um método de espírito semelhante: através de versões “alfa”, “beta”, etc., o produto vai sendo experimentado e ajustado conforme a satisfação da eventual clientela, que aliás não era exatamente conhecida no início do processo. Daí, uma startup “lean” (“enxuta”) opera com um plano de negócios que pode ser dinamicamente reformulado até que um modelo de negócios bem sucedido possa ser encontrado. Através de uma rápida mudança de pivô com base na realimentação fornecida pela clientela, uma startup pode estender seu espaço de manobra sem que sofra diluição significativa decorrente de uma nova rodada de financiamento. No laço de realimentação “Construir-Medir-Aprender”, considerado como “uma unidade de progresso”, um pivô é um ciclo completo, e o crescimento da startup se dá através de uma aprendizagem validada por meio de uma série de pivôs.
O termo pivô vem do fato de que quando empreendedores obstinados descobrem algo errado em sua idéia original, eles não simplesmente abandonam tudo. Ao contrário, mantêm um pé firme sobre o que aprenderam com a experiência anterior, e avançam com o outro pé na nova direção. Segundo as estatísticas, esse padrão de comportamento “zigue-zague” predomina entre as startups bem sucedidas.
Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

Nenhum comentário:

Postar um comentário