segunda-feira, 19 de abril de 2010

Problemas como Oportunidades e a Força Econômica das Startups


Problemas como Oportunidades e a Força Econômica das Startups

E-mailImprimirPDF
Nas palavras de quem conduz o empreendimento que está mudando radicalmente o mundo em que vivemos, Eric Schmidt, CEO da Google: “A vida é longa, mas o tempo é curto. A vida é longa no sentido de que temos memória longa. O tempo é curto porque você tem que se mover muito rapidamente. Mas, para mim a coisa mais importante a saber é que a vida tem uma forma de lidar com as coisas.
Esquecemos tão rapidamente qual era o problema três ou quatro anos atrás. Daí, minha visão pessoal da vida é que todo problema é uma oportunidade.” É exatamente nesse espírito que Spencer Ante, blogueiro e comentarista econômico até pouco tempo da BusinessWeek, e hoje Deputy Bureau Chief no Wall Street Journal, em matéria intitulada “Fertile Grounds for Startups” (BusinessWeek, 12/11/09), chama à atenção para o fato de que a história mostra que o empreendedor se alimenta de condições adversas. Ante começa citando o exemplo de Caterina Fake, co-fundadora do portal de compartilhamento de fotos Flickr, adquirido pela Yahoo!, que, aos 40 anos de idade, mesmo com a economia em ritmo de recessão em pleno mês de Junho de 2008 e sem dar sinais de que se recuperaria em breve, deixou um posto executivo confortável na Califórnia para co-fundar uma empresa de internet chamada Hunch em New York que, com base nas experiências de outras pessoas, se presta para ajudar seus usuários a tomar decisões. “O espírito empreendedor floresce em situações de adversidade. O mundo está cheio de mais possibilidades”, diz Fake acrescentando que ama recessões. A aposta da Hunch é que há espaço para uma nova tecnologia de busca, indo além do que oferece o engenho de busca da Google: propiciar respostas com base na chamada “sabedoria das multidões” (em inglês, “wisdom of crowds”). “A próxima fase em busca é um certo casamento de algoritmos de força bruta com conteúdo gerado pelo usuário,” prevê Fake.
Em contribuição como blogueiro convidado do TechCrunch intitulada “Why a Bad Economy Is the Best Time to Start a Business” (10/04/2010), Adam Penenberg (autor do livro “Viral Loop”, Hyperion, Outubro/2009), relata que seu trabalho de investigação cuidadosa sobre os fatores que levaram empresas como Facebook, Twitter, Flickr, e Skype a um crescimento tão volumoso e tão rápido o fez se deparar com o fato de que cada uma delas foi fundada quando a economia estava estagnada, em má situação, ou até mesmo em recessão. Um tanto emblemático é o caso da Hewlett-Packard que, em 1939, nos últimos anos da Grande Depressão, foi fundada em uma garagem por dois engenheiros formados em Stanford. Aliás, o próprio Vale do Silício foi, em grande medida, criado durante período de incômoda recessão em meados da década de 1970. Admitindo que essa seja supostamente uma característica de toda empresa do ramo de internet fundada desde o estouro da bolha da Nasdaq, Penenberg observa que na verdade isso caracteriza algumas das empresas mais bem sucedidas em toda a história. A começar por Procter & Gamble, General Electric, Home Depot, Microsoft, até Apple, todas surgiram num período de depressão econômica e/ou estagflação. Igualmente contrárias à negatividade do cenário econômico vigente, e hoje verdadeiros ícones da industria da tecnologia da informação, Adobe, Lotus, Silicon Graphics, e Sun surgiram e cresceram em meio à recessão de 1982. Além disso, o estouro da bolha da internet em 2001 não impediu que toda uma leva de empresas de internet e mídia social que inclui MySpace, Facebook e Twitter, atingissem valores de mercado na casa dos bilhões de dólares em apenas uns poucos anos.
Como explicar essa resiliência, ainda mais quando se sabe que o volume de investimentos em capital de risco cai dramaticamente quando a economia se encontra em má situação, resultando em menos disponibilidade de financiamento para as startups? Em números concretos, se no auge do entusiasmo em torno da economia da internet em 2000 o total investido em startups chegou a atingir a casa dos US$100 bilhões, em 2008 o volume caiu para US$27 bilhões, caindo ainda mais para US$20 bilhões em 2009 (mesmo patamar de 1998). Penenberg acredita que a explicação está no fato de que em tempos difíceis o dinheiro é gasto mais sabiamente, ou seja, quando a economia passa por um aperto os investidores tendem a gravitar em torno das empresas com planos de negócios (e de receita) bem articulados. Mas há outros fatores determinantes, a começar pela relativa facilidade de atrair e reter os melhores talentos em tempos de maior taxa de desemprego, passando por custos menores em termos de aluguel de escritório, e de contratação de mão de obra. O fato é que as startups continuam figurando como principais agentes da criação de empregos.
A confirmação vem sob forma de dados estatísticos trazidos num relatório intitulado “Where Will The Jobs Come From?”, de autoria de Dane Stangler e Robert E. Litan, publicado pela Ewing Marion Kauffman Foundation em Novembro de 2009. Partindo da observação de que a recessão de 2007 a 2009 se revelou como a pior desde o final da Segunda Guerra Mundial em termos do número de empregos perdidos, o relatório afirma que a chave para a recuperação econômica deverá vir sob a forma de empregos novos a serem criados.  E se propõe a responder a uma pergunta que não quer calar: de onde virão esses novos empregos?
Usando dados de 2007 do United States Census Bureau, os autores avaliam a criação de empregos em termos da idade da empresa ao invés do seu tamanho. Segundo eles, de 1980 até 2005 quase todo o saldo de criação de empregos nos EUA ocorreu em empresas com menos de cinco anos de idade.  Em geral, o acréscimo líquido de empregos de ano para ano vem de três fontes: (1) startups (tecnicamente, empresas de zero anos de fundação); (2) empresas jovens (de 1 a 5 anos de fundação); e (3) as empresas maiores e mais antigas. Existe, naturalmente, o efeito sanfona com a criação de empregos nos extremos mais jovem e mais antigo do espectro de idades das empresas, e essencialmente estável no meio do espectro. Isso não diz tudo, pois não apenas é preciso levar em conta que nas empresas jovens ocorre o vai-e-vem de criação e destruição de empregos como também é necessário prestar atenção à dinâmica interativa entre as empresas mais jovens e as mais antigas. Não obstante, a criação de empregos em startups fundadas em períodos turbulentos é “menos volátil e menos sensível a declínios que a criação de empregos na economia como um todo”, afirma o relatório.
Os dados também mostram que sem startups a criação de empregos da economia americana seria negativa em praticamente todos os anos, com exceção de uns 4 a 5 anos. Uma análise do censo de 2007 sem considerar as startups mostra que empresas jovens ainda são responsáveis por aproximadamente dois-terços da criação de empregos, dando uma média de quase quatro novos empregos por empresa em cada ano.  Segundo os autores, diante desses dados, fica claro que empresas novas e jovens e os empreendedores que as criam são os motores da criação de empregos e da eventual recuperação econômica. Dos 12 milhões de novos empregos criados em 2007, quase 8 milhões se devem a empresas jovens.
Ainda segundo o relatório da Kauffman Foundation, é muito frágil a relação entre o volume de empregos criados em empresas pequenas em um dado setor e o crescimento do setor como um todo em termos do número de postos de trabalho. Por outro lado, há uma relação extremamente estreita entre o crescimento de empregos de qualquer que seja o setor e o desempenho de empresas jovens naquele setor. Definitivamente, empresas jovens são os motores da criação de empregos, conclui o relatório. A separação por idade da empresa, e não seu tamanho, como o puxador da criação de empregos, tem diversas implicações, especialmente para os responsáveis por políticas públicas que insistem na visão de que pequenas empresas são a resposta para um cenário de empregos preocupante. Nesse caso, ao que tudo indica, idade é documento. Sem desmerecer o papel da pequena empresa, analisar empregos em termos do tamanho da empresa parece revelar muito pouco sobre a criação de novos empregos. Seria mais preciso e muito mais revelador, segundo o estudo da Kauffman, discutir emprego em termos da idade da empresa.

Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

terça-feira, 6 de abril de 2010

O Recente Frenesi de Investimento em Startups de Internet

O Recente Frenesi de Investimento em Startups de Internet

E-mailImprimirPDF

6 de abril de 2010 - Imagine empresas jovens que sequer dispõem de um modelo de negócios receberem valorações (e investimentos) de cifras milionárias por parte de investidores em capital de ventura, tudo isso num momento em que as economias americana e mundial ainda se encontram em estado de recuperação de uma crise financeira de grandes proporções. Pois bem, com apenas 4 meses de fundação, Blippy foi recentemente valorada em US$38 milhões. Quora, considerada ainda em estágio beta, está valorada em cerca de US$86 milhões. Da sua parte, Foursquare, fundada em Março de 2009, sairá das negociações em curso com uma valoração da ordem de US$80 milhões ou mais, prevêem os analistas. Além de extremamente jovens, todas essas três empresas de internet carecem de qualquer arrecadação de receita. Convenhamos, doze meses atrás valorações como essas seriam inimagináveis.

Levando em conta que o mercado de IPO (oferta pública inicial) ainda se encontra praticamente fechado para startups, e que a maioria das aquisições permanece na casa das dezenas de milhões de dólares, o que sugere a inexistência de saída lucrativa para os capitalistas de ventura (os chamados “VC’s”) que investem no nível dessas valorações, Michael Arrington (editor do blog TechCrunch) reuniu nada menos que três “reis” da indústria do capital de ventura do Vale do Silício (“Top VCs Debate Rising Startup Valuations”, 04/04/2010) para buscar entender o que está por trás desse recente frenesi de investimentos em startups: Marc Andreessen (pioneiro dos navegadores da internet, incluindo Mosaic e Netscape), Ron Conway (considerado por muitos o mais prolífico e bem sucedido investidor anjo do Vale do Silício), e David Hornik (empreendedor e investidor em diversas startups de sucesso, incluindo Blippy), todos pareciam mais preocupados com fechar um desses negócios “quentes” do que com o espantoso crescimento das valorações. Conway ainda comenta que as valorações supracitadas podem dar a impressão de que se perdeu o controle, mas que é preciso olhar cada um dos três casos com a devida diligência.

Fundada em Dezembro de 2009 por Ashvin Kumar, Chris Estreich e Philip J. Kaplan, apoiada num financiamento de US$1,6 milhão vindo de diversas empresas proeminentes de capital de ventura incluindo Charles River Ventures e Sequoia Capital, assim como de investidores-anjo do calibre de Evan Williams (co-fundador da Twitter) e Jason Calacanis, a Blippy serve ao propósito de compartilhamento de informações sobre compra de bens e serviços, tudo isso com vistas a facilitar a discussão e a comparação sobre compras entre usuários que estejam conectados online. Por essa razão é considerada a “Twitter das finanças pessoais”.

Segundo Conway, a FourSquare, que propicia um serviço de compartilhamento de localização em tempo real, pode vir a ser a nova Twitter dos serviços de localização. Com apenas 12 meses desde sua fundação, a FourSquare já serve a uma comunidade de usuários que ultrapassa a casa dos 500 mil membros de todo o mundo.

Considerada uma das startups mais “quentes” do Vale do Silício no momento, Quora teve sua primeira versão beta privada lançada em Janeiro de 2010. Fundada por Adam D’Angelo e Charlie Cheever, ambos ex-funcionários da Facebook, Quora se apresenta como “uma coleção de perguntas e respostas sendo continuamente melhorada cuja criação, edição e organização fica por conta de quem utiliza o serviço.” E continua: “A coisa mais importante é fazer com que cada página de pergunta se torne o melhor recurso possível para alguém que deseja saber sobre a pergunta.”

Em tom de surpresa com o volume de dinheiro sendo investido em startups que mal nasceram, Arrington indaga aos seus entrevistados o que os faria se interessar por empresas tão jovens e tão altamente valoradas, caso estivessem diretamente envolvidos na negociação. Conway simplifica dizendo que trata-se de uma transformação de um mercado “para vendedores” em um mercado “para compradores” para a empresa ou idéia certa. Em sua intervenção, Hornik demonstra compartilhar do sentimento de surpresa lembrando a escassez de dinheiro no mercado, e concluindo que, nessas condições, deveríamos estar presenciando um mercado “para compradores”.

Andreessen prefere argumentar que, em geral, a teoria é a de que há um pequeno número de empresas que têm o potencial de se tornarem verdadeiramente importantes. Essas seriam aquelas empresas que são iniciadas por seus próprios fundadores que têm a capacidade de construir empresas grandes, importantes e bem sucedidas. Segundo um estudo realizado por Andrew Rachleff, da Stanford Business School, a cada ano o setor de tecnologia cria por volta de 15 empresas que, no final das contas, vão acabar produzindo uma receita de US$100 milhões anuais ou mais, e são essas empresas que se tornam as grandes empresas de franquia tais como as Googles, as Salesforces, as Facebooks, etc. Essas se tornam o evento verdadeiramente importante. Segundo Andreessen, muitos investidores no Vale do Silício deixaram de investir na Google no seu início devido à sua valoração ainda como startup, mas que hoje se lamentam por terem deixado a oportunidade passar. Algo semelhante ocorreu com a Facebook.

Como fruto de sua enorme experiência, e faro aguçado que o fez acreditar na Google quando Larry Page e Sergey Brin não tinham sequer um plano de negócios, Conway insiste na importância da boa diligência quando se está diante de um caso de uma alta valoração sendo atribuída a uma startup: ao investidor que competiu pela participação no investimento e venceu fica o sentimento de que aquela será uma das 15 empresas que vai produzir uma receita na casa dos US$100 milhões.

Sábias palavras, sobretudo quando vindas de quem é descrito como “o homem que mais apostou em startups de internet do que qualquer outra pessoa no Vale do Silício”, e é tema de livro na área (“The Godfather of Silicon Valley: Ron Conway and the Fall of the Dot-coms”, AtRandom, 2001).

Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

Investimentos e Notícias (São Paulo), 06/03/2010, 00:41hs, http://www.investimentosenoticias.com.br/ultimas-noticias/artigos-especiais/o-recente-frenesi-de-investimento-em-startups-de-internet.html

segunda-feira, 29 de março de 2010

À Busca de uma Métrica para a Inovação

À Busca de uma Métrica para a Inovação

E-mailImprimirPDF

29 de março de 2010 - Tão elusivo quanto nem sempre apropriadamente empregado, o conceito de inovação serve muito bem aos evangelistas tecnológicos (os autênticos e os nem-tanto) em seus discursos de futurologia sobre a tecnologia e seu impacto econômico e social.

Se, por um lado, muitos já disseram que inovação é a aplicação de capital à descoberta científica, por outro lado, até mesmo autoridades no assunto revelam suas idiossincrasias nas suas próprias definições do termo: Peter Drucker (autor de “Innovation and Entrepreneurship: Practice and Principles”, Harpercollins, 1985) diz que inovação é “mudança que cria uma nova dimensão de performance”; Genrich Altshuller (autor de “The Innovation Algorithm”, Technical Innovation Center, 1999, originalmente publicado em russo em 1973) prefere dizer que se trata de uma “reconciliação de contradições”; Piero Bassetti (da Fondazione Bassetti) define inovação como sendo a “realização do improvável”.

A recente publicação do IEEE de um relatório sobre “Poder de Patente” trazendo um ranking das empresas com base no número de patentes obtidas em 2009 e as acumuladas até o presente, e a reação de alguns especialistas aos critérios de classificação levou Tim O’Reilly, uma das vozes mais influentes no Vale do Silício, a provocar uma discussão sobre a métrica da inovação. Em “How do we measure innovation?” publicado em 26/03/10 no blog “O’Reilly Radar”, o autor começa citando as reações de Ari Shahdadi e Brad Burnham ao relatório do IEEE, e, depois de se declarar amplamente favorável a ambas, lança o desafio de se construir uma métrica que refletiria o poder transformador de agentes como a própria web, a Google, a Facebook, a Amazon, a Craigslist, e a Wikipedia, nenhuma delas reconhecidamente líder em número de patentes. Segundo O’Reilly, é fundamental dar conta também de todas as áreas nas quais pequenas empresas criam valores e não dispõem de tempo, dinheiro ou inclinação para desviar esforços de inovações para patentes.

Shahdadi se refere ao artigo “Patent Power Scorecards: Japan Ascendant” (por Patrick Thomas e Anthony Breitzman, Mar/2010) que anuncia o relatório do IEEE, especificamente quando os autores afirmam que a recessão econômica atingiu severamente a inovação nos Estados Unidos, pois em 2008 o número de solicitações de patente permaneceu constante em 456 000, tornando-o o primeiro ano desde 1996 em que não houve um aumento no número de solicitações submetidas. Para Shahdadi, seria importante acabar com o uso de estatísticas de patenteamento como uma métrica para a atividade inovadora, especialmente por grupos como o IEEE. Mais ainda, há que se encontrar uma métrica que permita correlações mais estreitas em áreas específicas tais como “o número de transistores em um microprocessador” ou “o número de usuários gerando novo conteúdo online”. Enfim, há a necessidade de se encontrar uma alternativa à mera contagem de patentes e de volume de gasto em P&D como métrica predominante, pois esses números estão sendo usados atualmente pelos responsáveis por políticas públicas para justificar regulação que, no final das contas prejudica a inovação em muitos setores.

Burnham, por sua vez, chamou à atenção para o fato de que gasto com P&D também é um mau indicador, pois, segundo ele, há desperdício em demasia em grandes empresas, e por essa razão a metodologia de medir inovação deveria ter algo a ver com a utilidade para o usuário final. “A Facebook tem tido um impacto maior sobre mais vidas que a IBM e eles não gastam uma fração do que a IBM gasta em P&D ou com patentes,” afirma Burnham.

O’Reilly insiste que deve haver uma maneira de medir a introdução de novos produtos, e, a partir daí, formar um ranking por novidade e por ampla aceitação, de tal forma que reflita uma medida mais substancial da inovação e seu impacto na economia. As políticas governamentais de financiamento assim como as decisões sobre políticas industriais e econômicas são diretamente afetadas pela medida da inovação, e por essa razão é preciso encontrar uma metodologia que leve em conta o impacto, e não o número de submissões de patentes.

Em comentário ao artigo de O’Reilly, Michael Bates (da 1Place Patent Attorney & Solicitors) leva em conta associar um valor a uma patente de forma a diferenciá-la das patentes inúteis, e cita um estudo recente sobre a determinação do valor relativo de uma patente na área de nanotecnologia. Trata-se do artigo “Discovery of factors influencing patent value based on machine learning in patents in the field of nanotechnology” por Scott D. Bass e Lukasz A. Kurgan, publicado na revista científica Scientometrics (2010), no qual a inovação foi medida indiretamente ao se estimar o valor relativo da patente associada. Foi possível identificar características comuns entre patentes de alto valor que poderiam ser utilizadas na previsão do valor futuro de uma inovação em nanotecnologia. E o raciocínio foi baseado no fato de que uma patente reflete uma mudança tecnológica na medida em que representa um resultado inventivo de uma forma que é padronizado em campos, países e períodos diferentes, permitindo o uso de técnicas analíticas de patentes com vistas a revelar: (1) as abordagens do inventor à luz das políticas econômicas da época; (2) a dimensão da comercialização da pesquisa acadêmica; (3) o resultado da tecnologia em termos do valor da patente. Daí, a simples contagem do número de patentes poderia dar lugar à estimativa do valor relativo da invenção, possivelmente em conjunto com outros critérios específicos da área.

No que revela uma clara falta de conformidade com a verdadeira paisagem da inovação tecnológica transformadora, a Stanford University aparece apenas em 13º lugar na categoria “Universidades/Educação/Treinamento”, segundo o relatório do IEEE. Além das globalmente conhecidas como responsáveis por tecnologias de disrupção (HP, Google, Yahoo!, Cisco, Sun, YouTube, NVIDIA), diversas empresas verdadeiramente transformadoras em seus campos de atuação foram criadas por docentes e alunos egressos do campus de Stanford: Atheros Communications, BEA Systems, Charles Schwab & Company, Cypress Semiconductor, DNAX Research Institute, E*Trade, IDEO, Intuit, LinkedIn, Logitech, Mathworks, McCaw Cellular Communications, Octel Communication, Orbitz, Rambus, Rational Software, Silicon Graphics, Taiwan Semiconductor, Tandem Computers, Tesla Motors, VMware, Zillow.

Embora tendo acumulado, desde a criação de seu Office for Technology Licensing, cerca de 2877 licenças de invenções tecnológicas, correspondendo a algo em torno de 1,27 bilhões de dólares em royalties arrecadados, Stanford se destaca, menos pelo número de patentes obtidas, e mais pelo poder transformador das inovações tecnológicas que acalentou durante todos esses anos desde a consolidação do Vale do Silício como celeiro de tecnologias disruptivas.

Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

Investimentos e Notícias (São Paulo), 29/03/2010, 08:16hs, http://www.investimentosenoticias.com.br/ultimas-noticias/artigos-especiais/a-busca-de-uma-metrica-para-a-inovacao.html

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Inovação Tecnológica, Audácia e o Genoma de Empreendedor

Inovação Tecnológica, Audácia e o Genoma de Empreendedor

E-mailImprimirPDF

22 de fevereiro de 2010 - A combinação de empreendedorismo e inovação tecnológica tem servido de combustível para uma fabulosa geração de riqueza e uma elevação do padrão de vida em todo o mundo, mais especificamente no seu epicentro: o Vale do Silício. Na verdade, o Vale do Silício é o maior e mais influente centro de alta-tecnologia no mundo e lidera todas as regiões metropolitanas nos Estados Unidos na amplitude e no escopo da atividade econômica que ele cria através da inovação tecnológica.

Desde os anos 1960’s, quando as empresas de tecnologia que estavam engajadas na fabricação de semicondutores, no projeto de computadores, e em produção de software e serviços, começaram a se agrupar simbioticamente na parte sul da Área da Baía de São Francisco, o Vale do Silício tem se tornado o cluster industrial de alta-tecnologia mais produtivo do mundo. A rede de pessoas, firmas, universidades e instituições de pesquisa, e agências governamentais tem propiciado um habitat ideal para empresas de alta-tecnologia nascerem e crescerem. Além do mais, os produtos dessas firmas de alta-tecnologia têm aperfeiçoado processos e modelos de negócio, gerado crescimento econômico, e contribuído decisivamente para elevar os padrões de vida em todo o mundo.

O Vale do Silício também continua a estar na ponta da inovação. De acordo com o U.S. Patent and Trademark Office (USPTO), em 2008, 11 das 20 cidades dos EUA com o maior número de patentes registradas estavam no Vale do Silício. Cidadãos do Vale do Silício receberam 13.231 (ou 7,9%, do total de 167.350) patentes de “utilidade” concedidas nos EUA em 2009, segundo a IFI Patent Intelligence, uma unidade da Wolters Kluwer Health que analisa dados sobre patentes do USPTO. (Patentes de utilidade são tipicamente concedidas a aqueles que inventam ou descobrem um novo processo ou máquina “útil”.) A produção de patentes do Vale do Silício foi particularmente forte quando comparada com outras áreas dos EUA, deixando para trás Nova Iorque (onde está o cluster de tecnologia conhecido como “Silicon Alley”) com 5,3%, o Texas com 3,5%, e Massachussetts (onde estão MIT e Harvard) com 2%.

Em comunicado conjunto da National Venture Capital Association (NVCA) e da StartUpHire (portal de empregos dedicado a postos de trabalho em startup’s) publicado em Novembro de 2009, foi revelado que 24.344 vagas listadas no portal foram preenchidas desde Janeiro de 2009. Combinadas com as 11.000 vagas listadas naquela ocasião, empresas startup’s criaram mais de 35.000 postos de trabalho nos Estados Unidos no ano passado, período notoriamente difícil no que concerne aos índices de desemprego. Segundo o relatório do US Department of Labor (“After the Dot-Com Bubble: Silicon Valley High-Tech Employment And Wages in 2001 and 2008”, por Amar Mann eTony Nunes, Ago/2009), apesar da recessão econômica, a disponibilidade de empregos de alta-tecnologia na verdade cresceram 2,5% em 2008. A média salarial, no entanto, caiu 1,5% naquele ano. O salário médio anual no setor de alta-tecnologia subiu de US$97.344 em 2001 para US$132.351 em 2008, um aumento de 36% no período. Em comparação, os salários médios anuais subiram apenas 21,7% considerando todos os outros setores.

Fundamental nisso tudo é o papel do empreendedor que acreditou nas suas idéias inovadoras transformando-as em produto, invariavelmente viabilizando uma nova perspectiva. Caberia perguntar qual seria o DNA de um empreendedor? Seria possível identificar características únicas de um empreendedor? Seria inato ou resultado de um treinamento? Tendo trabalhado com empreendedores por mais de 25 anos e se fixado na concepção de que o empreendedor já nasce feito, Fred Wilson (editor do blog AVC.com), em seu artigo “Nature vs Nurture and Entrepreneurship” (19/02/10), diz acreditar que há “características únicas e determinantes de empreendedores” e lista as que mais observou: (1) uma crença obstinada em si mesmo; (2) uma auto-confiança que beira a arrogância; (3) um desejo de encarar riscos e ambigüidades, e uma capacidade de conviver com eles; (4) uma capacidade de construir uma visão e vendê-las a muitas outras pessoas; (5) um imã para talentos.

Uma palavra parece resumir as três primeiras características: audácia. E sua contrapartida em ídiche, “chutzpah”, é apontada como um dos principais fatores no desempenho de Israel como um modelo de economia fortemente empreendedora por Dan Senor e Saul Singer, autores de “Start-up Nation: The Story of Israel's Economic Miracle” (Twelve Books, Nov/2009). Em 60 anos, com uma população de 7,1 milhões de pessoas, em constante estado de guerra, sem grandes recursos naturais, Israel produz mais startups que nações estáveis como Japão, Coréia, Canadá, e Reino Unido. Das 333 empresas estrangeiras (i.e., de fora dos EUA) listadas no índice NASDAQ, 63 são de Israel (mais que toda a Europa em conjunto), perdendo apenas para a China que contabiliza 102 empresas. Em termos de atração de “venture capital”, os números falam por si: per capita, Israel atraiu duas vezes o volume de investimento atraído por empresas americanas, e trinta vezes mais que a Europa. Tudo isso em meio à crise econômica. Senor e Singer recorrem ao sentimento de audácia (chutzpah) para justificar a resiliência israelense, que segundo eles está em toda a parte: na forma como estudantes universitários falam com seus professores, empregados desafiam seus superiores, e sargentos questionam seus generais. E lembram que o que há em comum entre Proctor & Gamble, General Electric, Hewlett Packard, Microsoft, e Google é que foram todas criadas ou tiveram seu primeiro grande impulse durante um período de declínio econômico. “É preciso chutzpah para tentar levantar dinheiro e começar um negócio quando outros estão fechando.”

A bem da capacidade de se reinventar, prevalece no Vale do Silício, tanto quanto em Israel, o sentimento de insatisfação com o status quo, aliado a uma cultura de desafio à autoridade, e uma atitude de tolerância à falha. Talvez aí estejam elementos básicos do genoma de um empreendedor.

Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

Investimentos e Notícias (São Paulo), 22/02/2010, 11:46hs, http://www.investimentosenoticias.com.br/ultimas-noticias/artigos-especiais/inovacao-tecnologica-audacia-e-o-genoma-de-empreendedor.html

Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online, Recife), 22/02/2010, 11:46hs, http://jc3.uol.com.br/blogs/blogjamildo/canais/artigos/2010/02/22/inovacao_tecnologica_audacia_e_o_genoma_de_empreendedor_64540.php