segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

A Internet Interativa e o Laço de Expansão Viral

A Internet Interativa e o Laço de Expansão Viral

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21 de dezembro de 2009 - Fenômenos virais (ou viróticos), segundo a etimologia do termo, são aqueles que apresentam um processo de derivação anormal, e, em geral, de forma rápida, independente e hospedada (isto é, requer um hospedeiro). Pode-se definir também como objetos ou padrões capazes de se replicar ou converter outros objetos em cópias de si próprios quando esses objetos lhes são expostos.

A idéia de associar o adjetivo viral a algo diferente de um vírus biológico somente veio a se consolidar justamente com a popularização da internet na segunda metade dos anos 1990’s. A bem da verdade, o primeiro a escrever sobre marketing viral, por exemplo, foi Douglas Rushkoff em seu livro “Media Virus: Hidden Agendas in Popular Culture” (Ballantine Books, 1994), que, entre outras coisas, chama à atenção para o fato de que a palavra “mídia” (em inglês, “media”, cuja tradução literal seria “meios”) se refere tanto à ferramenta para disseminar informação quanto ao substrato sobre o qual os geneticistas fazem crescer bactérias e vírus. A idéia é que se um anúncio atinge um usuário “suscetível”, esse usuário se tornará infectado (ou seja, passa a aceitar a idéia) e vai então compartilhar a idéia com outros, infectando-os. Desde que cada usuário infectado compartilhe a idéia com mais de um usuário suscetível na média, o número de usuários vai crescer conforme uma curva logística, cujo estágio inicial de crescimento é aproximadamente exponencial.

Um objeto, ainda que não-material, é considerado viral quando tem a capacidade de espalhar cópias de si próprio ou de alterar objetos semelhantes de forma a se torná-los praticamente uma cópia dele mesmo sempre que esses objetos sejam expostos ao objeto viral. Trata-se de uma forma comum de descrever como pensamentos, informação e tendências se deslocam entre seres humanos. Os chamados “memes” são normalmente citados como os melhores exemplos de padrões virais. Segundo a Wikipedia, “um meme, termo cunhado em 1976 por Richard Dawkins no seu bestseller O Gene Egoísta, é para a memória o análogo do gene na genética, a sua unidade mínima”. No que concerne à sua funcionalidade, o meme é considerado uma unidade de evolução cultural que pode de alguma forma se autopropagar.

O que dizer da Hotmail.com, portal de correio eletrônico, que, em menos de seis meses após seu lançamento, já dispunha de 1 milhão de usuários cadastrados? Com menos de 1 ano e meio desde sua fundação, já eram 12 milhões de membros. Números de 2008 indicam uma população de 270 milhões de usuários. Em toda a história da mídia baseada em assinantes, nada havia crescido tanto e tão rapidamente. Nada fica a dever no quesito geração de riqueza, pois a campanha de US$50 mil de atração de novos membros da Hotmail atingiu patamares lendários: Sabeer Bhatia e Jack Smith, fundadores do portal, acabaram vendendo a empresa de apenas 18 meses de existência à Microsoft por nada menos que US$400 milhões.

Em seu livro recente “Viral Loop: From Facebook To Twitter, How Today’s Smartest Businesses Grow Themselves” (“Laço Viral: De Facebook a Twitter, Como os Negócios Mais Espertos de Hoje se Fazem Crescer”, Hyperion, Outubro 2009), Adam Penenberg conta que os usuários do Hotmail tomavam conhecimento do portal através da informação que circulava não apenas de boca em boca, mas também “de mouse em mouse”: o próprio correio eletrônico ia sendo utilizado para convidar amigos e parentes, e o e-mail se transformou num “laço viral”. Pesquisas indicaram que oitenta por cento dos que abriram uma conta no portal diziam que ficaram sabendo da existência da Hotmail através de uma mensagem de um amigo.

Coube a Tim Draper, capitalista de risco e investidor na Hotmail, conceber o laço viral: inserir, ao final de cada mensagem eletrônica a ser enviada, um linha contendo um convite para se inscrever no portal. A princípio, Bhatia e Smith demonstraram relutância em promover uma adulteração em cada e-mail enviado pelo portal, pois imaginavam que seus usuários poderiam se sentir invadidos caso a “propaganda” fosse de fato inserida automaticamente no final de cada mensagem. Convicto de que os benefícios superariam os riscos, Draper insistia argumentando que se o sucesso da empresa dependia do tamanho de sua base de usuários, seria preciso fazer tudo que estivesse ao seu alcance para fazê-la crescer o mais rápido possível. Da sugestão original “P.S. I love you. Get your free email at HoTMaiL.”, acabou sendo implementada uma versão mais curta sem a parte inicial “P.S. I love you”. Segundo relata Anenberg, o impacto foi quase que instantâneo: em questão de horas o crescimento do Hotmail disparou espetacularmente, começando com um crescimento médio de 3.000 usuários por dia. Após sessenta dias já haviam sido cadastrados mais de 750.000 usuários, e dentro de seis meses chegaram a 1 milhão. Cinco semanas depois foi atingida a marca dos 2 milhões, com uma taxa de crescimento de cerca de 20.000 novos usuários por dia.

A linha adicional contendo inclusive um link clicável para o portal acabou servindo como um pitch promocional para a empresa. Cada usuário, ao fazer uso do produto, acabava se tornando um vendedor involuntário, e esse endosso vindo de um amigo ou conhecido tornou-o mais poderoso e de maior alcance que a propaganda tradicional. (Que o diga a Juno, que investiu US$20 milhões em propaganda e marketing e mesmo assim a Hotmail ganhou três vezes mais usuários na metade do tempo.) Quem recebia uma mensagem enviada pelo Hotmail estaria vendo não apenas que seu amigo é um usuário, mas que o serviço funciona, e é gratuito.

O caso da Hotmail é emblemático na chamada nova economia. Muitas das mais bem sucedidas empresas da internet interativa, incluindo Google, MySpace, Digg, YouTube, eBay, LinkedIn, e as estrelas mais recentes Twitter e Flickr, são exemplos canônicos do chamado “laço de expansão viral”: para usar, é preciso espalhar. Afinal de contas, que sentido faz ser usuário do Facebook se nenhum dos seus amigos ou pares lá estiverem? O resultado é que nunca houve tamanho potencial para se gerar riqueza com tanta rapidez, em tamanha escala, e começando com tão pouco.

Em matéria no portal FastCompany (“Ning’s Infinite Ambition”, 11/04/08), Anenberg dá a receita: “Simplesmente projetando seu produto da forma correta, você pode montar um negócio bilionário a partir do nada. Sem orçamento para propaganda ou marketing, sem a necessidade de uma equipe de vendas, e os capitalistas de risco vão se matar pela chance de atirar dinheiro em sua direção”. O segredo, segundo ele, é o laço de expansão viral, um conceito pouco conhecido fora do Vale do Silício. “É um tipo de alquimia engenheira que, se for feita corretamente, quase que garante um crescimento auto-replicante: um usuário se torna dois, e depois quatro, oito, até um milhão e além”, acrescenta. Os laços virtuais estariam emergindo como possivelmente o maior significativo acelerador de negócios a atingir o Vale do Silício desde o engenho de busca. Em contraponto, Mike Masnick, em matéria no portal TechDirt (“Building A Viral Business Isn't About Alchemy”, 21/04/09) afirma que “‘laços de expansão virais’ pode ser um novo termo mas é apenas uma re-embalagem do ‘efeito de rede’.” Em matéria publicada um ano antes no mesmo FastCompany.com (“Network Effects”, 19/12/07), Eric Ransdell argumenta que “as empresas de internet crescem tanto e tão rapidamente pelo simples fato de abraçarem a mudança mental estratégica mais importante do século XXI”, e “em um mar de novos termos em economia, ‘efeitos em rede’ é a nova idéia através da qual mais e mais empresas traçarão seu caminho”.

Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

Investimentos e Notícias (São Paulo), 21/12/2009, 08:37hs, http://www.investimentosenoticias.com.br/ultimas-noticias/artigos-especiais/a-internet-interativa-e-o-laco-de-expansao-viral.html

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